3) A Terceira Galeria no Teatro do Châtelet

A Terceira Galeria no Teatro do Châtelet
Felix Vallotton
1895

























O quadro de Vallotton é semelhante ao de Devambez em diversos aspectos. Também ele retrata a platéia de um espetáculo, sugere a circularidade do espaço com linhas curvas e desloca o próprio espetáculo para fora do quadro. Mas aqui o assunto não é mais a harmonia inesperada entre a multidão e o espaço. Ao contrário, há pouquíssimos espectadores na platéia e mais espaço vazio do que ocupado. 

O teatro de Vallotton é praticamente monocromático, oscilando entre alguns tons de amarelo. As exceções são a parede esverdeada no canto superior esquerdo e o chão castanho escuro na porção inferior direita. A imensidão amarela é desnorteante, muito diferente do salão luxuoso de Devambez. O incômodo se intensifica com a disposição geometrizada das cadeiras e a perspectiva do espaço, levemente distorcida pelas linhas curvas.

Os olhos só encontram descanso em uma cor menos intensa e uma forma mais estável, lançando o olhar do observador diretamente para o pequeno grupo de pessoas no canto inferior esquerdo. O verde da parede do teatro reaparece no vestido de uma das moças, assim como o amarelo reaparece em um dos cabelos e o castanho reaparece em algumas peças de roupa. Ainda assim, existe tensão entre as pessoas presentes e o espaço que elas ocupam.

As pessoas aqui não compõem uma multidão, mas se diferenciam entre si - estão claramente destacadas do espaço, tanto pela sobriedade das cores quanto pela caricatura dos traços. A mulher de verde ri com escárnio, as outras senhoras olham apenas para o chão, o rapaz descansa a cabeça em uma das mãos, enquanto um guarda dorme na poltrona de trás. Todas as figuras demonstram absoluto desinteresse pelo espetáculo, incapaz de entretê-las - estão entediadas.  

De modo que, com um mesmo motivo temático, Vallotton mostra a dimensão oposta de Devambez. Lá o espaço suntuoso, aqui o espaço distorcido; lá a multidão compenetrada, aqui apenas alguns desinteressados; lá a dimensão de fascínio da experiência moderna, aqui a inevitável consequência do tédio diante de tanto espetáculo.

1 comentários:

  1. Outro ponto que também pode ser explorado é a presença de um fascínio autêntico dessa experiência moderna ou um comportamento que está ligado à convenção social. Como você disse, o ambiente do outro quadro é suntuoso e pelo menos uma parte desse público é igualmente suntuosa, já que o enquadramento inclui tanto os assentos mais baratos do teatro (no mezanino, nível superior do teatro) quanto outros que são muito mais caros (primeiro balcão e o nível da orquestra). Ou seja, é a burguesia em seus vários níveis de riqueza. Talvez a tela do Concerto Colonne individualmente não permita uma interpretação nessa direção, mas juntando com essa do Châtelet dá para relacionar a ausência desse fascínio relacionado à posição social.

    Achei muito eloquente o nome da tela evidenciar que é justamente a terceira galeria do Châtelet, onde ficam alguns dos lugares mais distantes do palco e mais baratos. O ponto que eu pensei se justifica por isso e por essa galeria estar quase vazia: em uma sociedade que faz da cultura um acontecimento social (ingresso, roupas apropriadas, atitudes etc), a presença do outro para julgar, aprovar e observar é essencial. No outro quadro existe uma aparente harmonia pois um teatro lotado exige comportamento austero, e o desnível social sublinha essa exigência, porque o mais pobre procura se comportar como o mais rico. Mas em um teatro praticamente vazio, com uns poucos para observar suas ações, a necessidade de aparentar interesse por uma cultura que não lhe diz respeito cuja apreciação é imposta é bem menor.

    E detalhe: o observador na tela do Colonne está na terceira galeria do teatro (VISH).

    Gostei do blog, continue escrevendo! ^^

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